19 de jul. de 2009

Se meu apartamento falasse...

Nessa selva de pedra onde o mundo torna-se cada vez mais vertical, quem nunca teve esse pensamento?

Pois isso já é passado. Assisti um filme com esse nome, por mero acaso. Estava eu no lugar certo, na hora certa, no dia certo, clicando os canais da Tv na hora certa. Isso dias atrás. Hoje acpnteceu novamente.

O filme Se meu apartamento falasse (The Apartment) é de 1960 e teve nada menos de 10 indicações ao Oscar, sendo que ganhou 5, incluindo melhor Filme, Diretor e Roteiro. Estrelado por Jack Lemmon e Shirley MaclLane (indicados ao oscar de melhor ator e atriz, respectivamente) o mesmo é dirigido por Billy Wilder e escrito por ele mesmo. O filme mostra a vida de C.C. Baxter (Jack Lemmon) sendo regida unicamente pelo sucesso profissional, querendo subir profissionalmente na empresa de seguros com 30 mil funcionários em Nova Iorque onde trabalha. Para isso, ele usa métodos nada convencionais emprestando seu apartamento para Chefes da sua empresa onde os mesmos levavam suas amantes, praticamente tendo um revezamento semanal para o mesmo. A vida de Baxter muda de sentido ao conversar cada vez mais com a assenssorista Fran Kubelik (Shirley MacLane). Chega a ser hilário.

A comédia passa a ser romântica quando Fran Kubelik entra em cena e causa certo transtorno ao ser amante do Big Boss da empresa, Jeff Sheldrake (Fred MacMurray), chefe imediato de C.C Baxter devido aos "empréstimos" de seu apartamento. Vale ressaltar que a atuação de Shirley MacLane é impecável. Óbviamente não irei falar mais do filme para não estragar a surpresa.

Além de tratar de uma comédia romântica de primeira linha Se meu apartamento falasse dá pitadas de críticas na sociedade e para sociedade já naquela época. Billy Wilder mostra como o Homem pensa apenas no seu bem estar na sociedade e dentro de uma organização, tanto na parte profissional, chegando a ser bitolado (CC Baxter emprestando seu apartamento aos seus chefes para subir na empresa) quanto na parte amorosa, ou melhor, prazerosa, mostrando os homens levando suas amantes ao apartamento sem nenhum remorso.

Se meu apartamento falasse é um filme feito a 50 anos atrás, mas ainda muito atual para os dias de hoje. Fiquei pensando como seria ter visto esse filme nos anos 60, com costumes totalmente diferentes dentro de uma sociedade altamente consumista. Ainda aconteceriam alguns fatos, como a Guerra do Vietnan, a Revolução Feminista, influencia de Martin Luther King, os Hippies invadindo as ruas, John Kennedy como presidente, a Guerra Fria no auge, o Homem pisando na Lua, ufa!

Não deixem de assistir. São 125 minutos de investimento cultural.

9 de jul. de 2009

Dia desses

A noite estava agradável, mas tudo foi piorando.

Após passar um pouco mais de uma hora bebendo cerveja com um amigo, recebi uma ligação de outro colega avisando que o mercado financeiro estava desaquecendo, tudo estava desvalorizando e o dia amanhã seria bem agitado.

Desliguei o celular, já pensando nos problemas que me cercariam ao acordar.

Me despedi do meu amigo e fui pegar o ônibus. No ponto, algumas poucas pessoas. Uma moça falava alto no celular. Chamava tanta atenção que um rapaz, também no ponto de ônibus começou a olhar pra ela de forma diferente.

A calçada, ainda úmida da chuva, refletia as luzes fortes dos anúncios e outdoors coloridos. Num canto da esquina, um mendigo ajeitava seu papelão e jornal para tentar passar sua noite.

Meu ônibus chegou. Coincidentemente a moça entrou na frente. Era bonita. Entrei em seguida e quase com o ônius partindo, o rapaz que observara a moça entrou no mesmo. Paguei a passagem com meu cartão e sentei quase nos fundos. A moça sentou mais a frente e o rapaz, ainda a olhar a moça e seu celular, sentou dois bancos atrás dela.

Pensei em colocar o MP3 no ouvido, mas achei melhor ouvir os sons da cidade. Nada belo. Apenas sirenes, buzinas, motores e alguns gritos vindos de fora. Alguns poucos passageiros conversavam.

Era a poesia urbana.

Depois de alguns minutos dei sinal. Ao descer do ônibus, reparei que aquele rapaz se levantou e sentou ao lado da moça que embarcou no ônibus. Ficou colado a ela. Rapidamente ela desligou o celular e ficou petrificada. Era tarde demais. Não havia nada que eu pudesse fazer.

Fui andando pela praça molhada pela chuva. Não fazia frio, mas o vento era de certa forma incômodo. Minha gravata estava afrouxada no pescoço e só não voava porque o nó não permitia. Meu óculos ainda ficava com algumas gotas respingadas e minhas roupas estavam tão amassadas que parecia que eu havia levantado de um caixão, até devido a minha aparência cadavérica, mas não magra.

Durante o caminho, vi mais mendigos montando seus lugares pra dormir. Alguns brigavam entre eles. Outros juntavam mais jornal e mais papelão. Um deles, com um pedaço de madeira na mão, dava ordem aos demais. Outros gritavam ao redor de uma lata ardendo em fogo por dentro, rezando, orando, dançando, algo do gênero. Um deles olhou pra mim de forma gelada. Devido ao meu preconceito e até certo ponto instinto de auto-preservação, fiquei alerta, mas nada aconteceu. Continuei a andar.

Desci ao metrô. Perto da escadaria um jovem casal apaixonado se beijava ardentemente. Não lembrava mais a quanto tempo eu tive aquilo. Eu não lembrava mais o que era esse desejo. Do outro lado duas mulheres tentavam trocar carícias, andar de mãos dadas, mas se continham devido aos olhares alheios. Vi um livro que me interessou na máquina de Best-Sellers mas o trem havia chegado. Entrei no mesmo instante.

O trem, quase vazio, parecia um refúgio mental para os passageiros. Nessa hora decidi ouvir um pouco de música. - A poesia urbana está lá fora, não aqui dentro - pensei. Foi aí que uma moça, bem mais nova do que eu, sentou quase do meu lado, desnecessariamente. Reparou na minha pasta, na minha roupa social amassada e principalmente no meu crachá descuidadamente dentro do bolso da minha camisa. Começou a perguntar coisas sobre mim, sem nenhum compromisso ou vergonha. Com uma barreira mental novamente, fiquei alerta. Olhei ao redor se mais gente estava com ela, mas na hora senti vergonha de mim mesmo. Era apenas uma adolescente sozinha, querendo conversar. Era nítda sua carência, sua necessidade de ser ouvida e de dialogar descentemente.

Conversamos a viagem toda. Da estação que eu peguei o trem até meu destino eram cinco estações. Ela perguntou tantas coisas, conversamos tanto que nem dei conta de que eu precisava descer. Quando cheguei na minha estação, levantei abruptamente e ela perguntou se podia ficar com o número do meu telefone. Respondi a ela: - Nos encontraremos novamente e conversaremos mais - . E saí do trem em direção a saída da estação, olhando pra trás seu rosto de desapontamento.

Há muito tempo eu não tinha uma mulher pra mim mas não queria dessa forma. Preferi deixar ela sonhar, afinal, hoje em dia é tão raro. Quem sabe o destino nessa selva de pedras não faça sua parte?

Saí da estação de metrô e vi duas ligações perdidas no meu celular. Uma era de um número desconhecido. Outro era do meu chefe. Preferi ignorar os dois.

Cheguei no prédio onde moro e econtrei com meu vizinho na portaria. Ele saindo e eu entrando. Era um pouco mais velho do que eu, mas em boa forma. Falei um "tudo bom" e ele apenas mexeu a cabeça positivamente. Eu o vejo a 6 anos todos os dias e sei absolutamente nada a respeito dessa pessoa. Aliás, sei absolutamente nada de todos os habitantes do prédio onde resido.

Abri a porta do meu apartamento e o mesma se encontrou totalmente escuro. Parecia uma catacumba. Nem meu gato de estimação veio me fazer companhia. Até ele me abandonou. Joguei a pasta no sofá e a gravata na cadeira da mesa de jantar. Era estranho estar sozinho novamente. Já estava acostumado com a presença dela. Era esquisito não sentir o aroma do seu perfume, nao ouvir sua voz no fundo da casa ou até mesmo suas broncas repetitivas e enfadonhas com sua voz renitente.

Era mais estranho ainda querer todas essas pequenas coisas novamente.

Não sentia fome para jantar. Meus amigos comentaram que eu havia perdido um pouco de peso. Após esquentar a água para fazer um café, meu celular começou a tocar. Por um momento, por um fio de esperança, pensei que era ela. Vi o número e o nome piscando no celular. Era outra pessoa, outra mulher me ligando, bem mais linda e atraente mas muito menos interessante. Não era ela. Não me interessava. Nesse momento senti uma falta enorme de sua companhia, mas me controlei.

Seria difícil dormir naquela cama enorme sozinho de novo.

Respirei fundo. Aos poucos estava me acostumando com essa sensação. Voltei a sala, coloquei a xícava de café com leite e adoçante na mesinha e desabei no sofá. O mesmo ainda tinha o cheiro dela. Isso era tortura. Peguei o controle da televisão e liguei o mesmo. Minha mente estava vazia e nem um pouco afim de ser preenchida.

Então, antes de dar uns goles no café e adormecer no sofá, acabei assistindo uma parte do telejornal, passando quase tudo aquilo que eu acabara de ver nas ruas.

Tudo igual, mas de formas diferentes.